OS MEDIA VS O POVO

 

A cobertura do evento trágico da manifestação contra o desemprego foi o motivo de uma grande controvérsia para os telespectadores angolanos, que poderia até ser pelo agravamento e agitação por parte do povo manifestante, mas que se deve à duplicidade da narrativa entre o povo angolano e como o evento acabou por ser moldado pela Televisão Publica de Angola (TPA).



Perante o pico da pandemia do Corona Vírus, o povo de Luanda extremamente revindicado e no desespero de ter a sua voz ouvida, no sábado 24 de Outubro mobilizou-se numa manifestação agitada contra os grandes níveis de desemprego e o extremo custo de vida no país.

Angola vive desde o ano de 2014 até ao presente dia uma crise económica e financeira devido à queda dos preços do petróleo. Embora a promessa de um ciclo económico de crescimento, pelo presidente João Lourenço, eleito em 2017, o povo angolano sobrevive com um salário mínimo de 21 454,10 kwanzas (60 euros mensais) mediante preços exorbitantes até para os produtos mais simples e necessitados

A taxa de desemprego angolana em 2019, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), foi correspondente a 31,8% com uma estimativa de 4 milhões de angolanos desempregados. Num contexto pandémico de 2020 houve um acréscimo de 4% nesta taxa, o número de desempregados, os custos de vida só têm aumentado.

O desespero da população ao viver uma falsa promessa de uma Angola melhor levou à manifestação no dia referido, mas pouco pode dizer-se da recepção e atendimento às necessidades do povo.

“Jovens da UNITA provocam arruaça e destruição de bens públicos” marcaram os “headlines” da Televisão Pública de Angola. O desespero de um povo foi intitulado como um acto de desordem, o caos da necessidade de auto-sustento como rebeldia ao mandato contra o ajuntamento de mais de 5 pessoas devido ao contexto da pandemia.

É inquestionável a importância da imparcialidade dos media para uma democracia, onde eles moldam os acontecimentos a favor do interesse político, é impossível os telespectadores terem uma noção concreta da realidade. Após 103 feridos e uma alegada morte, a cobertura televisiva não só marginaliza a causa, mas montou e incentivou a marginalização das vidas perdidas na tentativa de dar voz à sua dor.

A narração de factos e o jornalismo investigativo esperado foi, ao invés, substituído por uma narrativa alternativa e de pouca sensibilidade aos milhões de jovens desempregados que enfrentam não só a pandemia do corona vírus, mas a falta de meios de sobrevivência.

“Quando o povo que te elegeu decide ir à rua para reivindicar a melhoria das condições sociais, o Governo deve atender e resolvê-las ao invés de usar bárbara e impiedosamente a violência”, comenta o MIC – Movimento Independentista de Cabinda. A reportagem da TPA inclui entrevistas de condutores nas estradas, impedidos de guiar por causa do ajuntamento da população na rua, que por sua vez nem estão a par da situação, mas falha em dar voz aos manifestantes e representar a reivindicação do povo juvenil recém-formado, mas sem previsão alguma de arranjar emprego. Ou, ainda, jovens desmotivados da educação quando a necessidade de um sustento é maior.

Foram detidos cidadãos e jornalistas enquanto exerciam a sua profissão, contudo a Polícia não só apagou imagens da manifestação como os submeteu a agressões. A liberdade de imprensa segundo o artigo 44º da Constituição Angolana por direito garante a liberdade, que não pode ser sujeita a qualquer tipo de censura prévia, quer política, ideológica ou artística. É relevante destacar a importância deste direito no sector comunicativo para que se possa tomar decisões livres, motivadas pela ética jornalística e não pela censura policial e política.

O papel das emissoras nacionais é cada dia mais desvalorizado quando não se sabe se o que se recebe é a verdade ou simplesmente o que o povo deve acreditar como nos tempos mais remotos de ditadura. As redes sociais como Twitter e Instagram têm-se tornado fontes de maior confiança em Angola para os jovens.

João Lourenço (Presidente de Angola) no discurso de vitória nas eleições políticas em 2017:
“Vamos corrigir o que corrigir o que está mal e melhorar o que está bem”.

Como pode um país melhorar o que está mal, quando não é recebida a voz do povo concernente às suas necessidades e descontentamentos?

Como pode um país melhorar o que está mal quando o interesse político é maior que a voz do cidadão? Quanto mais quando a sua voz é marginalizada dentre as emissoras nacionais.


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