Primeiro mata-se e depois logo se verá
A Friends of Angola (FoA) exige que as autoridades angolanas abram um inquérito para levar à justiça os responsáveis pela violação dos direitos humanos e liberdade de expressão, de manifestantes na província da Lunda Norte.
Em causa está a morte de um número ainda não determinado de manifestantes, que no sábado terão – segundo a versão oficial -tentado invadir uma esquadra policial em Cafunfo, município do Cuango, resultando, segundo números oficiais, em pelo menos seis mortos do autodenominado movimento do Protectorado Português Lunda Tchokwe e cinco feridos, entre os quais dois membros das forças de defesa e segurança.
“Esperamos também que o Presidente (João) Lourenço abrace os valores democráticos, respeitando a liberdade de reunião e expressão dos cidadãos angolanos”, refere-se no comunicado.
A FoA sublinha que os direitos humanos, de integridade física e de liberdade de expressão estão consagrados na Constituição da República (como se isso valesse alguma coisa) e na Declaração Universal dos Direitos Humanos ratificada por Angola (como se isso valesse alguma coisa), “mas, entretanto, estão a ser violados por autoridades que, por imperativo legal, deveriam ser as primeiras a respeitá-los”.
É claro que, mais uma vez, as autoridades do MPLA desconheciam que assinar acordos, declarações e similares implica cumprir o que lá consta…
Segundo a organização, o alcance e o exercício pleno de uma verdadeira democracia (que, de facto, não existe em Angola) é determinado também pela liberdade de expressão e manifestação pública dos descontentamentos dos nacionais face à governação dos seus representantes.
O balanço inicial do Comando Provincial da Polícia Nacional da Lunda Norte apontava para quatro mortos durante a tentativa de invasão, versão contrariada por activistas e responsáveis do movimento que, no sábado, disseram que as forças angolanas dispararam indiscriminadamente contra manifestantes desarmados, provocando 15 mortos e dez feridos.
O Movimento Protectorado Lunda Tchokwe (MPLT) tinha convocado para sábado uma manifestação para apelar ao Governo angolano que negoceie a autonomia daquela região, rica em diamantes, com base num acordo entre o povo Lunda-Tchokwe e o governo colonial português, que não foi tido em conta após a independência de Angola.
Num comunicado, a Polícia Nacional referiu-se a um suposto acto de rebelião, de aproximadamente 300 manifestantes, que pretendiam ocupar uma esquadra de polícia, eram portadores de armas-de-fogo do tipo AKM, caçadeiras, ferros, paus e outras armas brancas, bem como pequenos engenhos explosivos artesanais.
Entretanto, a UNITA e a CASA-CE condenaram os incidentes ocorridos no sábado em Cafunfo, na Lunda Norte, e exigiram um inquérito parlamentar sobre a ocorrência.
O presidente do MPLT, José Mateus Zecamutchima, disse que 15 pessoas morreram e dez ficaram feridas, incluindo uma criança.
Num comunicado, o Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA tornou público o seguinte comunicado de imprensa:
«1. A Constituição da República de Angola, no seu artigo 47º, consagra o direito de Liberdade, de Reunião e de Manifestação; tendo o legislador reconhecido os mesmos direitos como fundamentais;
2. Ademais, no seu artigo 59º, também, dos direitos fundamentais, consagra a proibição da pena de morte.
3. Nesses termos, o Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, condena com veemência o acto bárbaro perpetrado por agentes das forças de defesa e segurança, contra populações indefesas, que procuravam apenas exprimir a sua vontade de ver os problemas das suas comunidades resolvidos, ou quanto menos, as autoridades prestarem atenção devida as populações;
4. O Secretariado do Comité Permanente da UNITA, manifesta perplexidade pelo conteúdo do Comunicado emitido pelo Comando da Polícia Nacional na Lunda Norte, que prioriza a justificação do acto bárbaro com informações que à partida começam a ser desmentidas no terreno. É triste e de lamentar a falta de atitude humanista, que deveria caracterizar os agentes da autoridade do Estado nestas circunstâncias, pois é notório o comportamento de falta de comoção e de indignação que o comunicado revela;
5. Diante de informações que apontam para um balanço provisório de cerca de quinze (15) mortos e dez (10) feridos; perante as imagens horrendas, com corpos de seis (6) cidadãos, expostos em hasta pública, ensanguentados e com indícios de fuzilamento; e um agente da Polícia Nacional a torturar um ferido que se encontrava entre os mortos, o Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, manifesta repulsa e profunda indignação, pois, nada em tempo de Paz, justifica o uso desproporcional da violência contra cidadãos nacionais;
6. Diante da gravidade dos factos alegados no comunicado do Comando Provincial da Polícia Nacional na Lunda-Norte e das imagens que circulam nas redes sociais, assim como, os depoimentos de alguns populares locais, o Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, insta a Assembleia Nacional, a criar com carácter de urgência, uma Comissão Parlamentar de Inquérito para “in loco”, constatar e esclarecer a opinião pública Nacional e Internacional sobre o ocorrido;
7. O Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, exige do Presidente da República a tomada de uma posição perante o ocorrido e apela a solidariedade dos angolanos, com vista a exigir-se do Estado a responsabilização dos autores morais e materiais deste crime hediondo.
8. O Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, manifesta a sua profunda preocupação que em tempos de paz, actos contínuos de assassinatos ocorrerem sempre que haja qualquer manifestação de intenção de reunião ou de expressão pelos cidadãos;
9. O Secretariado Executivo do Comité Permanente da UNITA, lembra aos angolanos, que estes actos são recorrentes, sempre que o país entra em períodos pré-eleitorais, o que denuncia, práticas que visam semear o medo no seio das populações, foi assim com o “monte sumi” e agora Cafunfo.
10. O Secretariado Executivo do Comité Permanente UNITA, reafirma que a Democracia e a Paz são conquistas inalienáveis que não podem ser subvertidas, pelo que, exorta os cidadãos angolanos, a saber que é obrigação do Estado proteger e garantir os direitos fundamentais dos angolanos e não o contrário.»
Também o Colégio Presidencial da CASA-CE, terceira força parlamentar angolana, reagiu com “incontida preocupação” às denúncias de buscas e assassinatos de vários activistas da Lunda Norte.
A CASA-CE destaca a “gravidade das denúncias, suportados por conteúdos audiovisuais, que reportam episódios de autêntica selvajaria à moda primitiva” com cidadãos “gravemente feridos” expostos a humilhação e carentes de assistência médica, sob custódia de agentes da Polícia Nacional e das Forças Armadas Angolanas.
A CASA-CE insta as autoridades angolanas a instaurar um inquérito no sentido de apurar a verdade das denúncias e, caso se confirmem, responsabilizar civil e criminalmente os seus autores.
Apela ainda ao poder legislativo para agendar “com carácter de urgência, o debate parlamentar sobre o exercício dos direitos de cidadania em Angola” e encoraja o povo Lunda a manter a serenidade.
O Bloco Democrático, força que integra a CASA-CE, lamentou o massacre de cidadãos “que exerciam o direito a manifestação”, um “acto que choca a consciência nacional” e em que o actual regime “mostra a sua verdadeira essência, recorrendo às armas para calar as vozes discordantes”.
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